Forças de manutenção da paz na Ucrânia e uma posição dura em relação à OTAN: as conversações de Zelenskyy em Bruxelas em detalhe

Sempre que o Presidente Zelenskyy participa em eventos internacionais, é inevitavelmente o centro de gravidade, e a cimeira da UE da semana passada, em Bruxelas, não foi excepção.

Esta cimeira foi particularmente significativa para a Ucrânia.

Para Zelenskyy, não se podia perder um evento que reuniu todos os líderes europeus, especialmente porque recentemente tem estado a negociar activamente com os parceiros da Ucrânia para estabelecer salvaguardas que mitigariam os riscos inerentes ao regresso ao poder do Presidente eleito dos EUA, Donald Trump. Zelenskyy argumenta que qualquer trégua ou “congelamento” na guerra russo-ucraniana seria extremamente perigoso, a menos que fosse acompanhada por garantias de segurança eficazes.

Estas garantias podem assumir diversas formas.

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Uma das opções discutidas em Bruxelas foi a implantação de uma missão de manutenção da paz na Ucrânia após qualquer futuro cessar-fogo. Alguns acreditam que a presença de forças de manutenção da paz ocidentais funcionaria como um impedimento para Vladimir Putin, impedindo-o de lançar uma nova guerra em grande escala.

Mesmo que isso seja feito, Zelenskyy insiste que Adesão da Ucrânia à OTAN deve permanecer na mesa.

Entretanto, tem havido recentemente uma mudança significativa na posição pública da Ucrânia.

A Ucrânia adoptou uma retórica robusta e uma posição forte sem concessões. A alteração aplica-se tanto a questões relacionadas com a OTAN como a questões de trânsito de gás, relativamente ao qual Zelenskyy foi pressionado em Bruxelas, mas manteve-se firme.

Entre a NATO e a União Europeia

A visita do Presidente Zelenskyy a Bruxelas esteve ligada à cimeira da UE, que reúne os líderes de todos os Estados-Membros.

Mas a oportunidade de falar com todos ao mesmo tempo também traz limitações. Como pode haver uma discussão séria sobre uma estratégia conjunta nas relações com Trump quando um dos participantes é Viktor Orbán, o primeiro-ministro húngaro pró-Putin e pró-Trump?

Isso significava que, além de participar na cimeira, a Ucrânia precisava de realizar uma reunião num círculo mais pequeno. Mas assim que Kiev começou a tomar medidas, os responsáveis ​​da UE opuseram-se, argumentando que, se as conversações fossem conduzidas sob a égide da UE, seria inapropriado convidar apenas os “parceiros-chave” da Ucrânia e excluir outros.

A ideia de nos reunirmos na sede da OTAN enfrentava desafios semelhantes. A Hungria é membro da Aliança e a posição de Türkiye, por exemplo, também suscita sérias preocupações.

Foi assim criado um formato único: os líderes reuniram-se na residência do Secretário-Geral da NATO, Mark Rutte. Na realidade, porém, nem Rutte nem a NATO organizaram a reunião – ela foi organizada pela Ucrânia.

A lista de participantes é digna de nota.

Além da Ucrânia, o OTAN Secretário Geral e o UE liderança, a reunião contou com a presença de representantes de sete países europeus: França, Alemanha e Itália (as três maiores economias da UE), o Reino Unido (um doador chave para as Forças Armadas da Ucrânia), Dinamarca e Holanda (principais apoiadores dos militares da Ucrânia que facilitaram o fornecimento de F-16), e Polônia, que recentemente deixou de fornecer ajuda militar, mas continua a ser fundamental para a logística de fornecimento de armas.

Também é importante observar quem não estava lá.

Porque é que o grupo dos principais parceiros da Ucrânia foi mantido tão pequeno?

Espanha, a quarta maior economia da UE, ficou atrás de outros países em termos das suas contribuições financeiras e da ousadia das suas decisões. Os Estados Bálticos, embora manifestassem o seu apoio à Ucrânia, poderiam ter sido vistos como excessivamente radicais, o que poderia ter alienado outros.

A Roménia, vizinha da Ucrânia, também não foi convidada, o que não foi bem recebido em Bucareste. O Presidente Klaus Iohannis teve mesmo de explicar a situação aos jornalistas. A Roménia encontra-se atualmente numa fase política de transição, enquanto aguarda os resultados das eleições, e a sua ajuda militar continua limitada.

Soldados da paz para a Ucrânia

Várias fontes europeias do Pravda confirmaram que durante esta e outras reuniões, os líderes discutiram garantias de segurança para a Ucrânia.

Espera-se que a pressão sobre Kiev para concordar com um cessar-fogo aumente em 2025. Trump não é o único líder que defendeu abertamente isto. Zelenskyy argumentou que, sem garantias robustas, Putin usaria qualquer trégua para reforçar as suas forças e lançar outro ataque. Portanto, devem ser criadas condições para, pelo menos, impedir a recuperação económica da Rússia (por exemplo, através da manutenção de sanções).

Há indícios de que esta mensagem foi ouvida.

Como tornar impossível uma nova ofensiva russa?

Uma das opções discutidas em Bruxelas é enviar uma missão de manutenção da paz nos moldes da ocupação russa, envolvendo tropas da NATO.

O Presidente Zelenskyy atribui esta ideia ao Presidente francês Emmanuel Macron.

“Apoiamos a iniciativa de Macron. A adesão à NATO continua claramente a ser a melhor garantia de segurança para nós. Mas até a Ucrânia aderir à NATO, isto poderá ser considerado.”

As conversações na residência de Rutte não tiveram como objetivo chegar a qualquer acordo. Essa ideia ainda está em sua infância.

Zelenskyy enfatizou que a mera presença de forças de manutenção da paz por si só não seria suficiente como garantia de segurança. O diabo está nos detalhes.

Uma das principais questões é o que aconteceria se a Rússia começasse a preparar-se para outro ataque ou se os bombardeamentos fossem retomados através da linha de contacto. As forças de manutenção da paz seriam retiradas devido a riscos de segurança? Kiev lembra-se vividamente dos acontecimentos do início de 2022, quando a maioria das embaixadas ocidentais deixaram Kiev ou mesmo a Ucrânia. O mesmo poderia acontecer com as forças de manutenção da paz?

Nesse caso, a missão teria pouco valor.

Outro ponto crucial, sublinharam as fontes do Pravda europeu, é que a missão de manutenção da paz deve incluir os Estados Unidos. Isto daria mais peso às garantias aos olhos de Moscovo.

“Além disso, percebemos que sem o envolvimento dos EUA, os países da UE por si só não seriam capazes de fornecer forças de manutenção da paz suficientes para que a missão fosse eficaz”, explicou uma fonte.

Zelenskyy permanece firme

O Presidente Zelenskyy sublinhou repetidamente em Bruxelas que a adesão à NATO continua a ser a única garantia de segurança verdadeiramente eficaz para a Ucrânia e que as outras opções são apenas medidas provisórias. Mas o Ocidente não está pronto para dar esse passo, e a equipa de Donald Trump está extremamente em dúvida quanto a convidar a Ucrânia a aderir à NATO.

A certa altura, havia esperanças de apelar à ambição de Trump, enquadrando-a como: “Biden era demasiado fraco para trazer a Ucrânia para a NATO, mas você é um líder ousado que o consegue”. Mas ficou claro desde o primeiro contacto com a equipa de Trump que não faz sentido levantar esta questão neste momento.

A resposta inicial de Kiev foi apresentar soluções criativas para a crise, o que levou ao recente discurso de Zelenskyy sobre a adesão parcial à NATO, com garantias apenas para certas partes do território ucraniano. A esperança era que esta proposta pudesse influenciar a nova administração dos EUA. No entanto, desde que mencionou a ideia várias vezes no final de novembro, Zelenskyy não a revisou.

De acordo com fontes europeias do Pravda,

A Ucrânia recebeu uma mensagem clara dos seus aliados ocidentais que pode ser resumida numa única palavra: “Parem!”

Explicaram a Kyiv que esta ideia é vista como uma concessão. Não ajudará nas negociações com Trump e poderá até sair pela culatra. A mensagem dos aliados foi: “Já parece que a Ucrânia se comprometeu. Vamos concentrar-nos noutras discussões.”

O Gabinete do Presidente captou a mensagem e ajustou a sua estratégia de “preparação para Trump”.

A estratégia atual baseia-se agora na firmeza.

A firmeza, porém, só será possível se a Ucrânia não agir sozinha. A Ucrânia precisa de chegar a acordo sobre ações e estratégias conjuntas com os seus parceiros europeus – algo em que Zelenskyy se tem concentrado recentemente.

A Ucrânia também começou a “mostrar o seu carácter” de forma mais aberta.

Isto não se aplica apenas à NATO, onde Kiev se recusa a aceitar a rejeição e continua a insistir na adesão.

A retórica cada vez mais robusta em relação a Putin –

Zelenskyy recentemente o chamou de “idiota” – faz parte da mesma estratégia.

Esta e outras declarações fortes pretendem enviar um sinal claro de que não faz sentido negociar com Putin.

A posição dura da Ucrânia também se tornou evidente na sua atitude para com Viktor Orbán e suas iniciativas, que têm sido notavelmente assertivas nas últimas semanas.

Outra questão fundamental sobre a qual Zelenskyy se manteve firme em Bruxelas foi a sua recusa absoluta em transitar gás russo, mesmo que esteja disfarçado de azerbaijano. Quando o primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico, tentou persuadir Zelenskyy do contrário durante a reunião de Bruxelas, foi firmemente rejeitado.

Zelenskyy explicou que há apenas uma condição sob a qual ele concordaria em transitar o gás russo: “Se um país europeu estiver disposto a aceitar o gás e não pagar o dinheiro à Rússia até que a guerra termine, então poderíamos pensar nisso. não admitiremos a possibilidade de ganhar milhares de milhões adicionais com o nosso sangue, com a vida dos nossos cidadãos”, afirmou.

Sérgio Sydorenko,
Editor, Pravda Europeu, de Bruxelas

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